Cartel de autopeça envolve 40 empresas

Cartel de autopeça envolve 40 empresas
Multas já passam de R$ 150 milhões

A onda de delações premiadas para escapar de punições mais severas influenciou fabricantes de autopeças a promoverem uma corrida ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para denunciar quem praticou cartel no País. O processo é um dos maiores desse tipo em número de empresas envolvidas de um único setor – são 40 até agora –, além de mais de 100 executivos. Já foram aplicadas mais de R$ 150 milhões em multas e ainda falta muito a ser investigado.

Em todos os casos há indícios ou já comprovação de condutas anticompetitivas, como acordos prévios de cotação a serem apresentados aos clientes, valores, aumento de preços e divisão de mercado. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) calcula que os preços de produtos em ambientes cartelizados são em média 30% mais altos do que na livre concorrência.

Subsidiárias de multinacionais já punidas por essas práticas nos EUA, Ásia e Europa se anteciparam às investigações no Brasil para se autodelatar e entregar concorrentes. O acordo de leniência, como é chamada a delação nesses casos, livra a empresa da multa e de processos judiciais. Como o benefício integral vale só para quem colaborar primeiro, há uma disputa para chegar à frente no Cade.

A Schaeffler foi multada em R$ 60,6 milhões.
A Schaeffler foi multada em R$ 60,6 milhões.

“Hoje, temos pelo menos dez processos administrativos instaurados”, informa o superintendente adjunto do Cade, Diogo Thomson de Andrade. Segundo ele, há outros em investigação. As principais prejudicadas pela concorrência desleal são as montadoras, mas também concessionárias e oficinas.

Andrade afirma que a Lava Jato também pode ter influenciado na decisão das empresas de colaborarem com as autoridades brasileiras. Mas ressalta que o movimento inicial é anterior à operação da Polícia Federal que, de certa forma, popularizou o instrumento da delação premiada no País.

Os primeiros processos no Brasil foram abertos em 2014, após período de investigações e formalização de denúncias. Nos demais países, os processos começaram bem antes. Nos EUA, envolveu 39 empresas e US$ 2,6 bilhões em multas. O executivo Shingo Okuda, da fabricante japonesa GS Electech, fornecedora de peças para montadoras americanas, foi condenado a 13 meses de prisão.

A Tenneco também fez acordo de leniência no segmento de amortecedores.
A Tenneco também fez acordo de leniência no segmento de amortecedores.

Primeira. Entre as envolvidas no processo local, algumas são multinacionais sem subsidiárias no País, ou com unidades que não produzem as peças envolvidas no cartel. Segundo o Cade, algumas das condutas internacionais tiveram efeito no Brasil, seja por meio de exportação de peças ou de veículos.

A alemã Bosch, maior fabricante de autopeças na América Latina, foi a primeira a fazer acordo de leniência no Brasil, após ser citada por sua concorrente em processo nos EUA. A empresa admitiu ter manipulado preços de velas de ignição com a NGK entre 2000 e 2013. As duas também repartiam os contratos a serem atendidos, para evitar queda em suas participações de mercado.

Bosch admitiu ter manipulado preços de velas de ignição com a NGK entre 2000 e 2013.
Bosch admitiu ter manipulado preços de velas de ignição com a NGK entre 2000 e 2013.

A Bosch não quis comentar o assunto. A NGK diz que coopera com as investigações. “Essa postura transparente é parte de nossas políticas mundiais de compliance e respeito irrestrito às leis do País.” A Tenneco também fez acordo de leniência no segmento de amortecedores envolvendo Affinia, Dana, Magnetti Marelli e Corven Sacif. A Tenneco afirma estar “cooperando totalmente com a investigação e que está comprometida com a transparência e total respeito às leis do País”.

Outra oportunidade para as empresas colaborarem com as investigações é fazer um Termo de Compromisso de Cessação (TCC). Segundo Andrade, os requisitos são os mesmos da leniência, mas, como chegou depois, a empresa tem direito a um desconto na multa. “Já foram feitos vários acordos que, no total, estabeleceram multas de mais de R$ 150 milhões”, diz. O dinheiro é recolhido pelo Tesouro Nacional e destinado ao Fundo de Direitos Difusos (FDF).

Entre as empresas que fizeram TCC, estão Schaeffler (multada em R$ 60,6 milhões), Affinia (R$ 11,5 milhões), Yazaki (R$ 55,8 milhões), TRW (R$ 8,9 milhões) e JTEKT/Koyo, Dana e Nachi (R$ 3 milhões cada). Algumas não tiveram nomes revelados. O valor da multa é um porcentual sobre o faturamento obtido no ano anterior ao da instalação do processo com a venda do item que fez parte do cartel.

Fonte – BVMI – Licio Melo – Cleide Silva/Oesp